19 março 2008

dos dias anteriores




















estas palavras viajam sem âncoras´
crescendo a despropósito
entre o céu da boca e a boca do corpo
digo
:estes são os dias do meu amado
o seu tempo desflora-me espesso como o ar
que a manhã lambeu na terra


no ventre terroso do seu corpo
onde por assim ser
começa o seu nome corpóreo
uma árvore de mil frutos
se intromete entre a língua e as mãos

:digo mil frutos e a minha boca não nega
o seu sabor de mel
- que ventos e chuva nos lavem da face da terra
e ainda assim o meu amado se erguerá
e com ele o seu e o meu tempo-

e nos seus olhos
nessas fronteiras de vidro onde
tantas
tantas vezes
espreito a eternidade
duas asas me esperam e me hão-de elevar
pelos céus

o meu amado viaja comigo e eu com ele
entre este e outro tempo e
entre este e outro tempo eu e o meu amado
permanecemos


(para ti, primavera em mim)

marc chagall, les amoureaux

01 março 2008

ao amante in(di)visível

“nem todo o corpo é carne”*,não
ó subtil incandescência dos olhos
rasto da luz coada por entre os dedos
palavra
-nome que se segrega como suores
minúscula e húmida de cor
soprada ao de leve pelos lábios

não é carne
os recessos sinuosos da memória
os lugares de mim onde a língua
percorrendo-te ávida
sobra nos lugares de ti. carne não é
o desfolho do teu tempo
nos quentes concâvos do meu
ou os dias que aí repousam
acantonados entre uma morte
e outra por vir


suspeito que mesmo a flor
tremenda
do meu ventre
rebentando agora cálida à tua beira
não é essa carne viva e pulsante como astro
mas uma qualquer outra história
de invisíveis
e indivisíveis enredos
mãos bocas fios e abismos com peixes dentro
onde marés e olhos
desvendam no mar os rios e
os ardores do sol
sabem
inevitavelmente
ao luar que aí morre

: não carne,
não











*david mourão ferreira
ia e vinha e a cada coisa perguntava que nome tinha- sophia

memória